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Crista neural

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Ilustração da formação da crista neural durante a neurulação

Crista neural (NC) é uma população de células multipotentes descrita pela primeira vez por Wilhelm His em 1868. Essa contribui para a formação de ossos, cartilagem e tecido conectivo da face, neurônios e células da glia do sistema nervoso periférico, células de pigmentação da pele e, em algumas regiões do sistema cardio vascular, mesênquima e células de músculo liso e está presente apenas em embriões de vertebrados.[1]

Ela se origina da interação da placa neural com o tecido ectodérmico não neural durante a gastrulação [2]. Durante a neurulação há o levantamento das pregas neurais e fechamento do tubo neural, nesse processo acontece a delaminação das células da crista neural, essas permanecem próximas a região dorsal do tubo neural.[1]

As células da crista neural (NCC's) são uma sinapomorfia dos vertebrados e foram evolutivamente necessárias para a formação da cabeça dos vertebrados. Acredita-se que os precursores das NCC's na escala evolutiva podem ser observados em cefalocordados e tunicados através de homólogos não funcionais deste grupo celular. Nestes casos estão presentes muitos dos fatores gênicos que promovem as características das células da crista neural, porém devido a vias metabólicas não integradas entre si, estes grupos celulares não possuem a mesma funcionalidade que as NCC's vistas em vertebrados.[3]

Formação da cabeça está ligado à existência da crista neural

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Através de experimentos funcionais, nos quais eram realizados explantes de crista neural de codorna em embriões de galinha, fora possível observar que muitas das estruturas que formam a cabeça são derivadas de células da crista neural, como parte do crânio e a mandíbula. Não somente as NCC's são capazes de formar diversas estruturas cefálicas[4] , como estruturas cefálicas de provenientes de linhagens celulares diferentes dependem da sinalização proveniente das NCC's para sua correta formação. Um exemplo disso é que o desenvolvimento do cérebro alterado caso seja retirada a crista neural cefálica. Estudos morfológicos apontam que esta interação da crista neural com o desenvolvimento do cérebro é mediada via FGF8.[5]

Morfologia e expressão gênica de especificadores da crista neural

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Na figura podemos ver as características da migração da crista neural. Dentre elas estão a perda da adesão celular, a expressão de integrinas e a passagem das células pela lâmina basal

Durante o processo de indução da crista neural, os padrões da sinalizações de BMP, WNT e FGF fazem com que sejam expressos diversos fatores de transcrição(tais como Pax3/7, Dlx5, Mxs1/2, Tfap2a) na região da borda da placa neural. Estes fatores de transcrição por sua vez ativam uma outra série de fatores de transcrição que irão especificar o destino das células da crista neural. Dentre estes fatores, os mais relevantes para a diferenciação das NCC's são os fatores de transcrição da famílias Snail, Fox e Sox.[6]

Para que a migração das células da crista neural ocorra da maneira correta é necessário que haja mudanças morfológicas nestes grupos celulares de forma a serem capazes de realizar a transição de epitélio para mesênquima (EMT).[7] Dentre estas mudanças morfológicas estão a perda da adesão com células vizinhas, a capacidade de atravessar a lâmina basal e a expressão de certos fatores necessários para a migração eficiente tais como integrinas. A perda da adesão celular deve-se ocorre através da quebra das junções aderentes e das tight junctions. A migração correta deste grupo celular depende fortemente da expressão de Rho GTPases que regularão as vias migratórias das células.[8]

Células da crista neural e o câncer

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Devido a ampla capacidade de migração das células da crista neural devido a certos fatores de transcrição, é de se esperar que a expressão errônea destes fatores em células não migratórias sejam capazes de interferir gravemente no indivíduo. No caso de tumores a expressão de fatores migratórios associados à migração da crista neural está associada à metástase desde tipo de tumor. É o caso do gene Slug, o qual é necessário para a perda da adesão celular da crista neural e portanto faz parte da modulação da transição epitelial para mesenquimal. Quando observa-se que este mesmo gene está sendo expresso em células tumorais, a o grau de malignidade do tumor tende a ser maior, assim como este gene tem um papel crítico na patogênese de tumores mesequimais.[9] Portanto o estudo deste grupo celular se mostra importante para a compreensão não somente do desenvolvimento embrionário, porém também para o entendimento da progressão de alguns tipos tumorais e a forma com a qual ocorre a sua metástase.

Indução da crista neural

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A formação da crista neural é induzida pela interação de sinalizações vindas da placa neural e do tecido ectodérmico não neuronal. Essas sinalizações sozinhas não são capazes de induzir a formação da crista neural, isso acontece apenas quando essas acontecem todas juntas[2]. Essas sinalizações levam há uma cascata de sinalização que como resultado mudam a expressão genica dessas células. Assim essas podem se diferenciar, delaminar, migrar e formar as estruturas derivadas da crista neural.

Sinalização por Bmp

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A sinalização por Bmp ( bone morphogenetic proteins) ocorre devido a expressão diferenciada dessa proteína na placa neural e no tecido ectodérmico não neural gerando um gradiente de Bmp entre esses, ou seja, onde de forma a crista neural. Isso acontece pois o tecido ectodérmico não neural expressa Bmp e a placa neural não.[10]

Sinalização Wnt

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A sinalização Wnt esta associada a diferenciação e sobrevivência das células da crista neural, sem essa há má formação de estruturas derivadas da crista neural.[11] Além disso, Wnt produzida dorsalmente pelo tubo neural esta envolvido com a expansão e migração das células da crista neural.[12]

Sinalização por Fgf

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Tem-se sugerido que o Fgf que faz a  sinalização da crista neural tem origem no mesoderma paraxial. A indução da crista neural é inibida quando é expresso um receptor de Fgf dominante negativo quando esses são combinados com o Fgf do mesoderma paraxial.[13]

Tipos de crista neural

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As células da crista neural se diferenciam em diversas estruturas no embrião conforme sua localização no eixo antero-posterior do embrião. Elas podem ser divididas em quatro tipos: crista neural cranial, crista neural cardíaca, crista neural vagal e sacral e crista neural do tronco. A principal diferença entre as crista neural cranial e a truncal é que a crista cranial não apresenta a expressão de genes Hox enquanto na truncal o contrário ocorre. Esta característica é um dos fatores para as diferenças no processo de determinação e diferenciação deste tipo celular. Acredita-se que a ausência dos genes hox na crista neural cranial foi um dos fatores evolutivos para o surgimento das estruturas faciais nos vertebrados.

Crista neural cranial

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Essas células migram dorsolateralmente e formam o mesênquima craniofacial. Este por sua vez se diferencia em cartilagem, osso, neurônios craniais, glia e tecidos conecfivos da face. Essas células também entram na faringe e dão origem as células do timo, odontoblastos e ossos da orelha media e mandíbula.[14]

Crista neural cardíaca

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A crista neural cardíaca fica entre a crista neural cranial e a do tronco. As células dessa crista neural podem se desenvolver em melanócitos, neurônios, cartilagem e tecidos conectivos[14]. Elas também produzem toda a parede tecidual musculoconectiva das grandes artérias e contribui para a formação do septo que separa a circulação pulmonar da aorta.[15]

Crista neural sacral e vagal

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As células dessa crista neural geram os gânglios parassimpáticos da barriga.[14]

Crista neural do tronco

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As células neurais do tronco podem tomar duas principais vias migratórias. A primeira é a transformação dessas células em melanócitos que migram dosolateralmente para a ectoderme e continuam até a linha mediana ventral da barriga. A segunda é a migração dessas células ventrolateralmente até a metade anterior de cada esclerótomo, essas células formam os gânglios da raiz dorsal que contem neurônios sensoriais. As células que continuam mais ventralmente formam  gânglios simpáticos, a medula adrenal e os agrupamentos de nervos que envolvem a aorta.[14]

Referências

  1. a b Huang, X., and Saint-Jeannet, J.P. (2004). "Induction of the neural crest and the opportunities of life on the edge". Dev. Biol. 275, 1-11.
  2. a b Selleck ,M.A., Bronner-Fraser,M. (1995) “Origins of the avian neural crest: the role of neural plate-epidermal interactions”. Development 121, 525-538
  3. Gilbert, Scott F. Developmental Biology. Sunderland, MA: Sinauer Associates, 2006. Print.
  4. Gross, J. B., and J. Hanken. "Segmentation of the Vertebrate Skull: Neural-crest Derivation of Adult Cartilages in the Clawed Frog, Xenopus Laevis." Integrative and Comparative Biology 48.5 (2008): 681-96. Web.
  5. Creuzet, S., B. Schuler, G. Couly, and N. M. Le Douarin. "Reciprocal Relationships between Fgf8 and Neural Crest Cells in Facial and Forebrain Development." Proceedings of the National Academy of Sciences 101.14 (2004): 4843-847. Web.
  6. Meulemans, Daniel, and Marianne Bronner-Fraser. "Gene-Regulatory Interactions in Neural Crest Evolution and Development." Developmental Cell 7.3 (2004): 291-99. Web.
  7. Nieto, M. Angela. "The Ins and Outs of the Epithelial to Mesenchymal Transition in Health and Disease." Annu. Rev. Cell Dev. Biol. Annual Review of Cell and Developmental Biology 27.1 (2011): 347-76. Web.
  8. Raftopoulou, Myrto, and Alan Hall. "Cell Migration: Rho GTPases Lead the Way." Developmental Biology 265.1 (2004): 23-32. Print.
  9. Pérez-Mancera, Pedro Antonio, Inés González-Herrero, María Pérez-Caro, Noelia Gutiérrez-Cianca, Teresa Flores, Alfonso Gutiérrez-Adán, Belén Pintado, Manuel Sánchez-Martín, and Isidro Sánchez-García. "SLUG in Cancer Development." Oncogene 24.19 (2005): 3073-082. Web.
  10. Sasai, Y., and De Robertis, E.M. (1997). “Ectodermal Patterning in Vertebrate Embryos”. Dev. Biol. 182, 5-20
  11. Brault, V., et al. (2001). “Inactivation of the b-catenin gene by Wnt1-Cre-mediated deletion results in dramatic brain malformation and failure of craniofacial development”. Development 128, 1253-1264
  12. Ikeya, M.,et al. (1997). “Wnt signaling is required for expansion of neural crest and CNS progenitors”. Nature, 389. 966–970.
  13. Mayor, R.,  Guerrero, N., and  Martı´nez, C. (1997). “Role of FGF and Nogginin Neural Crest Induction”. Dev. Biol. 189, 1-12.
  14. a b c d Gilbert, S.F.(2000). Developmental Biology. 6th edition. (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK10065/ )
  15. Le Lièvre ,C.S., Le Douarin, N.M. (1975) “Mesenchymal derivatives of the neural crest: analysis of chimaeric quail and chick embryos”. J Embryol Exp Morphol, 34, 125-154